Painel Semântico II – A revalorização da mulher como ser individual e sexual: Um manifesto pró-feminista de inspiração junguiana (2/3): O Pensamento Simbólico como Instrumento Feminista na Revalorização da Mulher Sexual




Painel Semântico II – A revalorização da mulher como ser individual e sexual: Um manifesto pró-feminista de inspiração junguiana (2/3): 

SONHAR COM LADRÕES é um projeto policoncetual que parte de uma combinação entre ensaio científico, escrita literária e ilustração por técnica de colagem, para contar a história ficcional de Laura, uma mulher pós-moderna confrontada com os desafios do seu próprio crescimento. Do ponto de vista concetual, a compreensão que quis subjacente ao construto de crescimento vem enformada pela intersecção de duas perspetivas distintas: uma psicológica, vazada no conceito de individuação conforme proposto por Carl Gustav Jung, o fundador da psicologia analítica; e uma outra, de cariz sócio-político e filosófico-ideológico, vazada nos esforços feministas de segunda vaga, valorizadores e celebratórios das qualidades e capacidades particulares das mulheres, com particular destaque para as questões da sexualidade.

A exposição tem por base a história do conto em prosa poética «Sonhar com Ladrões» exibido em 15 pranchas de texto (capítulos) a que se fazem corresponder 15 telas com as respetivas ilustrações, por técnica de colagem.

Seguem-se, em maior detalhe, as principais influências do projeto:

II – A revalorização da mulher como ser individual e sexual: Um manifesto pró-feminista de inspiração junguiana (2/3)

2. O Pensamento Simbólico como Instrumento Feminista na Revalorização da Mulher Sexual: 

 “Se eu me não tivesse tornado como a serpente, o diabo, a quintessência de tudo que é ‘serpenticice’, teria mantido esse poder sobre mim. Isso teria dado ao diabo o meu pulso e ele ter-me-ia forçado a fazer um pacto com ele, da mesma forma com que astuciosamente enganou Fausto. Mas antecipei-me a ele, unindo-me à serpente, assim como um homem se une a uma mulher” (C. G. Jung)

Durante séculos, a atividade sexual foi impositivamente apresentada às mulheres como mera forma de reprodução, e o prazer sexual reprimido como condenatório. Falar de orgasmos era – ainda o é para muitas – tabu na conversação convencional, e o recato protegia a falta de opinião. “A forte repressão sexual à qual as mulheres sempre foram submetidas, o sentimento de culpa, o nojo aos nossos corpos e nossos fluídos, o prazer que nos é negado, reflete de forma negativa na vida das mulheres, que desde à tenra idade de socialização, são proibidas de conhecer os próprios corpos. Masturbação é pecado. Sexo é pecado. A vagina é um orgão desconhecido, sujo, fedorento. Não toque, não sinta prazer” (Andressa Stefano).

Para Botton (2013), a atividade sexual ainda hoje é espartilhada por todo um conjunto de expectativas sociais, frequentemente sancionadoras, acerca de como as mulheres devem sentir, pensar e agir diante dela. Daí, voltando às ideias de Millett, o motivo pelo qual muitas são atormentadas pela culpa, por neuroses, fobias e desejos disruptivos, indiferença e até aversão ao sexo.

Por outro lado, muito em parte devido à herança do pensamento cartesiano, séculos de divisão entre espírito e matéria foram-nos distanciando da compreensão e da experiência da matéria como a algo sagrado.
Do ponto de vista analítico, enquanto permanecemos inconscientes da divindade inerente à matéria, a sexualidade é manipulada para preencher desejos do Ego.

Nenhum outro Arquétipo se presta a mostrar de forma tão explícita a proposta de integração entre o sagrado e o profano feminino como o da ‘Prostituta Sagrada’.

Esta imagem poderá aproximar a mulher de uma relação mais adequada com o seu próprio corpo já que: “A mulher que tem consciência da deusa, cuida de seu corpo com alimentação e exercícios adequados, e aprecia os rituais como banhar-se, vestir-se e aplicar cosméticos. Não se trata de propósito superficial, de apelo pessoal, relacionado à gratificação do ego, mas sim de respeito por sua natureza feminina. Sua beleza deriva de ligação vital com o Si-mesmo. Tal mulher é virginal. Isso não tem nada a ver com estado físico, mas com atitude interior. Ela não é dependente das reações dos outros para definir seu próprio ser. A mulher virginal não é apenas o reverso do homem, seja ele pai, amante ou esposo. Ela mantém-se em pé de igualdade em relação a seus direitos. Não é governada por ideia abstrata do que ela “deveria” ser ou “do que as pessoas vão pensar”.

Na medida em que agrega em si os lados sagrado e profano da mulher, esta imagem possibilita uma ampliação da limitada e excludente mentalidade ocidental. Considerando ao binómio Lilith-Eva, norteador do enredo de «Sonhar com Ladrões», importa talvez recuperar a determinação de Lilith, a primeira mulher de Adão, expulsa do paraíso porque no primeiro ato sexual exigiu o direito ao prazer sexual e se recusou a ser passiva durante as relações sexuais, de forma a passar da repressão à incorporação da vida sexual como um dos aspectos essenciais da vida da mulher.

Embora a mulher moderna fale cada vez mais tranquilamente sobre desejo, sobre excitação e orgasmo, partindo à procura deles de forma mais criativa, é ainda importante recordar a relevância da educação afetivo-sexual para a erradicação de tabus, e a promoção de uma melhoria ao nível da saúde e da qualidade de vida.

O culto dos sentidos tem sido frequentemente, e muito justamente, condenado, dado que os homens sentem um natural instinto de terror em relação às paixões e às sensações que parecem ser mais fortes do que eles, e de que têm a consciência de partilhar com formas de vida inferiores. Mas era evidente […] que a verdadeira natureza dos sentidos nunca fora compreendida, e que permaneceram indomáveis e animalescos unicamente porque o mundo procurava submete-los pela abstinência ou matá-los pela flagelação, em vez de procurar transformá-los em elementos de uma nova espiritualidade, em que um elevado instinto de beleza seria a característica dominante” (Oscar Wilde).

[Continua no próximo post]

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