Painel Semântico I – O Processo de Individuação por Carl Gustav Jung (2/3): O Ser fragmentado: Que fizemos ao Simbólico?



Painel Semântico I – O Processo de Individuação por Carl Gustav Jung (2/3)

SONHAR COM LADRÕES é um projeto policoncetual que parte de uma combinação entre ensaio científico, escrita literária e ilustração por técnica de colagem, para contar a história ficcional de Laura, uma mulher pós-moderna confrontada com os desafios do seu próprio crescimento. Do ponto de vista concetual, a compreensão que quis subjacente ao construto de crescimento vem enformada pela intersecção de duas perspetivas distintas: uma psicológica, vazada no conceito de individuação conforme proposto por Carl Gustav Jung, o fundador da psicologia analítica; e uma outra, de cariz sócio-político e filosófico-ideológico, vazada nos esforços feministas de segunda vaga, valorizadores e celebratórios das qualidades e capacidades particulares das mulheres, com particular destaque para as questões da sexualidade. 

A exposição tem por base a história do conto em prosa poética «Sonhar com Ladrões» exibido em 15 pranchas de texto (capítulos) a que se fazem corresponder 15 telas com as respetivas ilustrações, por técnica de colagem.

Seguem-se, em maior detalhe, as principais influências do projeto:

I – O Processo de Individuação por Carl Gustav Jung (2/3)

2. O Ser fragmentado: Que fizemos ao Simbólico?: Não raro, ao longo da minha prática clínica, percebo-me expressa ou indeclaradamente a reforçar o aforismo de Jiddu Krishnamurti sobre “não [ser] sinal de saúde estar bem adaptado a uma sociedade doente”. Numa cultura em que, por demais amiúde, a educação tem como resultado a eliminação da espontaneidade e a substituição de atos psíquicos originais por sentimentos, pensamentos e desejos sobrepostos ao desenvolvimento da individualidade genuína, fomenta-se cada vez mais uma vivência não-existencial.

Há toda uma antropologia racionalista aos comandos da moderna sociedade industrial que, marcada pelo raciocínio concreto e pela orientação para o fatual, típicos do pensamento operatório, percebe as emoções, a ligação à atividade fantasmática e o simbolismo como obstáculos atentatórios à produção humana e, como tal, de remoção desejável. Se o paradigma de determinada época é o reflexo dos seres que o adotam e o validam, então poderíamos dizer que actualmente o ser humano se encontra fragmentado e desconectado.

Natureza e cultura, instinto e moralidade, sexualidade e realização tornaram-se incompatíveis, como resultado da cisão na estrutura humana” (Reich, 1995). Este é o retrato do homem doente, o retrato do homem cindido, o retrato do homem na necessidade de união consigo mesmo – na necessidade do simbólico (do grego sym-ballo: atirar juntas duas coisas, voltar a reuni-las, como sinal de reconhecimento; duas partes de uma mesma realidade que antes estavam separadas).

Apoiando estas reflexões, Jung considera que “só a vida simbólica pode expressar a necessidade da alma”, e é pela sua ausência que a vida se banaliza e se lacuna de sentido, levando a que a atividade humana se disperse na sôfrega busca de um lucro externo que possa compensar o vazio interior e na perseguição de objetivos crescentemente irrealizáveis de riqueza, segurança e felicidade. “A vida é demasiado racional; não existe nenhuma existência simbólica na qual eu [indivíduo] seja outra coisa”.

O pensamento simbólico é um conhecimento ancestral próprio do ser humano que se antecede à linguagem e à razão, e apresenta-se como um sistema pautado pelo seu carácter polar, contendo em si a capacidade de unir o micro ao macrocosmo, o casual ao acausal, o desordenado ao ordenado, cabendo-lhe a missão de reintegrar o Ser Humano – consigo mesmo e com os outros. A ideia subjacente ao processo de individuação de Jung considera justamente que a saúde deve ser reconquistada a partir da união destes percebidos opostos.

Chamado à acção pelo reconhecimento das problemáticas de uma vivência não-existencial em sequência desta fragmentação, quis pôr em marcha um projeto de sensibilização sobre o fenómeno, e evocar o processo de individuação de Jung era uma grata inevitabilidade.

[Continua no próximo post]

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

HOJE NO DIVÃ... Janel Bragg | Watermedia artist, Artwork studious, Photographer [EDIÇÃO INTERNACIONAL]

Painel Semântico I – O Processo de Individuação por Carl Gustav Jung (3/3): Em que consiste o Processo de Individuação?

HOJE NO DIVÃ... Filipe Gonçalves | Cantor, Músico, Compositor, Apresentador de TV e MC